Toda a vida fui fascinada pelas formas e cores das plantas, flores, árvores.
Ainda muito pequena observava os musgos e líquenes por entre as pedras da calçada lisboeta, maravilhada pela minúcia daqueles pequenos seres.
Na escola primária de Sassoeiros, no Inverno, percorria alguns caminhos pelo bairro da Mina afora em busca de musgo para o presépio. E observava lírios do campo e outras flores azuis, lilazes, amarelas que eu não sabia nomear. Ou acompanhava a minha mãe a uma quinta perto de casa que vendia flores – e que flores, que cheiros que beleza, a perdurar dias a fio no jarro da sala!
E quando aos nove anos - quando se percebeu que sou miúpe e recebi uns óculos não fiquei aborrecida por essa carga, fui totalmente compensada com o prémio de poder olhar - observava as magníficas imensas verdes - de tantos tons! - folhas das árvores, do jardim frente à varanda do meu primeiro andar na Pampilheira, julguei que rebentava de delírio do prazer de ver.
Nos anos seguintes partes dos meus dias eram “gastos”, ganhos, a usufruir a beleza das coisas. Exerci a contemplação, a tranquilidade do pensar em harmonia com a natureza.
Mais tarde veio o mar, as ondas, o céu. Os pássaros, os gatos, cães, primatas, insectos.



Ainda hoje se pretendo acalmar-me penso numa libelinha, numa sardanisca ao sol sobre uma pedra no meio de um campo verde salpicado de lilás.

E revigoro-me em pequenos passeios por bosques esquecidos de betão – bendita crise!
A contradição – aparente – entre o progresso e a conservação preenche-me os pensamentos. O desgosto da pobreza e o sortilégio da diminuição da construção. Sim, quero Cascais cheio de campos selvagens, plantas silvestres, ervas de todo o tipo não mondadas. Quero poder ver os lírios do campo, quero deixar de ouvir o barulho dos carros a atazanar o músculo cardíaco.

O Cascais da minha infância, da minha juventude, já não existe.
Mas ainda há nichos.
Por enquanto é nesses nichos que ainda posso recuperar daquela raiva – para quê tanta casa vazia, tanta estrada, tanta gente acumulada? Porquê tanto desprezo pela clorofila pelos seres que partilham connosco o sol? Para quê tanto utilitarismo no pensar a árvore?
Cada um de nós é mero pó de estrelas. Eu, o musgo, o gato. Por acaso aqui estou. E enquanto estou respeito aquilo que fui, que sou e aquilo em que me vou tornar. Parte da natureza.


2014-04-10
Paulina Esteves